O dilema lusitano


Portugal tem agendado para depois de amanhã um novo encontro entre selecções nacionais. A partida, diga-se, de brincadeira, vem no seguimento de um longo período de paragem da selecção que se seguiu aos tais inesquecíveis quatro a zero diante de "nuestros hermanos". Num jogo que para pouco ou nada servirá (isto, se excluirmos o "incrível" mediatismo dado ao simples facto de de um lado estar Cristiano Ronaldo e do outro Lionel Messi), interessa apenas tentar perceber onde residia (ou reside) o problema nacional.

Senão vejamos, Portugal iniciou a campanha de apuramento para o Euro 2012, no rescaldo de uma breve passagem pelo Mundial, de uma maneira quase insólita: um empate a quatro bolas com o Chipre. Como se não chegasse um resultado assim frente a tal potência do futebol europeu, os comandados de Carlos Queiroz (um, em particular) complicaram ainda mais as contas do apuramento ao perder na Noruega. É neste ponto na história recente da selecção que se terá de questionar até onde é que os resultados negativos surgiram no seguimento da falta de brilhantismo dos nossos jogadores, e a partir de quando tudo teve a ver com o seleccionador. Ainda que pareça descabido culpar um só homem por uma sucessão de eventos, a verdade é que, por mais que se tente, é difícil ilibar Queiroz no meio de tudo isto. E tudo começou no Mundial; Portugal esteve mal na África do Sul, independentemente de como se olhe para os diferentes jogos. É certo que faltou sorte, é certo que houve "roubo", mas todos ficamos com o sentimento de que devíamos (e não apenas que "podíamos") ter ido mais longe. E tudo correu mal a partir daí.



A selecção regressou recambiada da África do Sul mais cedo, mas a notícia do afastamento estava longe de ser a última e pior do Verão. Para mal de Portugal, problemas exteriores ao jogo em si deram começo àquele que seria um período de autêntico desastre para a equipa. Queiroz estava envolto em polémica, alegadamente devido a um tal controlo anti-doping, e quem sofria com isso era a selecção. Se Portugal não estava bem, pior ficou com este período de instabilidade. Faltava liderança entre os jogadores, que pareciam mais frustrados do que propriamente motivados, e logo num momento crucial para o futuro na Europa. Já falei aqui dos maus resultados, e aparentemente é relativamente simples de achar um bode espiatório para tudo isso. Regressando ao tema desta crónica, importa sim realçar um novo período de mudança que surgiu (e que, possivelmente, continua em progressão). A selecção ganhava um novo comando, às mãos de Paulo Bento e, coincidência ou não, apenas esse simples facto bastou para que, nos jogos seguintes, Portugal atingisse resultados que permitem, hoje, continuar a sonhar com uma presença na fase final do Euro 2012. Tudo graças a esse "salvador da pátria".

Não há como retirar mérito a Bento pelo trabalho até agora desenvolvido enquanto seleccionador. Tendo sido a única alteração a ocorrer na comitiva lusa em todo este período (além de, e parafrasiando um certo ex-presidente, algumas "maçãs podres" terem abandonado o barco), o treinador tem, agora, depositada nele a confiança da generalidade dos portugueses que ainda sonham. Contudo, algo de estranho continua a passar-se com a selecção, algo que, mais uma vez, nada tem a ver com o futebol. À semelhança do começo do desastre com Queiroz, um novo problema burocrático está em cima da mesa: os estatutos da FPF. Apesar de não implicar uma pessoa em particular, a verdade é que a situação em redor dos estatutos da FPF já levou inclusivamente a que tanto a FIFA como a UEFA ameaçassem a Federação de que a selecção nacional poderia ficar de fora do europeu, caso os novos estatutos não sejam aprovados. Em primeira instância, o problema seria de resolução relativamente simples. Mas tal não foi, até à presente data, o caso. Os estatutos têm sido sucessivamente chumbados, o que contribui para o aumento da especulação. E logo agora que, pela primeira vez em bastante tempo, a selecção parecia ter acertado o passo ...



O jogo de quarta-feira vai, contudo, ser um bom teste à organização de Portugal naquilo que realmente interessa entre burocracias: o futebol. Será interessante desvendar até que ponto o jogo de promoção ao falhado mundial ibérico foi um golpe de sorte ou mérito, e para isso nada melhor do que enfrentar os mais fortes adversários. Depois de manhã se confirmará se o "abanão" de Bento encaminhou a selecção em direcção à glória, ou se tudo foi fruto do acaso. Ainda assim, a situação exterior ao campo é matéria sensível, que necessita de cuidados imediatos. Exige-se tanto ao presidente como à assembleia que consigam encontrar uma solução para a situação actual, nem que isso passe pela demissão de Madaíl. Há que saber, acima de tudo, colocar os interesses de Portugal em primeiro lugar. E já que se fala da Federação, porque não recomendar que não se siga o exemplo de FIFAs, UEFAs, e Boards internacionais, onde os mesmos dinossauros reinam sem fim aparente à vista.